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ENTREVISTA


Fernanda Brenner. Fotografia: Everton Ballardin.


Kunsthalle Lissabon "ocupado" por PivĂŽ.


Vista da exposição Rocambole, Kunsthalle Lissabon.


Vista da exposição Rocambole, Kunsthalle Lissabon.


Vista da exposição Rocambole, Kunsthalle Lissabon.


Vista da exposição Rocambole, Kunsthalle Lissabon.


Vista da exposição Rocambole, Kunsthalle Lissabon.

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JORGE MOLDER



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MIGUEL VON HAFE PÉREZ



JOÃO RENDEIRO



MARGARIDA VEIGA




FERNANDA BRENNER


 

Rocambole, no Brasil, e torta enrolada em Portugal. Com recheio a gosto do mais tradicional de cada país - goiabada ou doce-de-leite lá, e doce de ovos aqui –, esse bolo comprido e enrolado, deu o nome da exposição dos brasileiros Flora Rebollo, Thiago Barbalho e Yuli Yagamata, que ocupou o espaço da Kusthalle Lissabon, no projeto da instituição Pivô.

No ano passado, a instituição paulistana localizada no Copan - emblemático prédio de Oscar Niemeyer no centro de São Paulo, com uma população diária de 4 mil pessoas passando por ali – recebeu a primeira exposição realizada em conjunto pelos três artistas. Marcada por desenhos multicoloridos, a coletiva ocupava parte do espaço de 3,5 mil metros quadrados de curvas assinadas por Niemeyer. Em abril, a exposição realizada a seis mãos atravessou o Atlântico para ganhar, em Lisboa, uma versão “pocket” criada para o espaço quadrado e subterrâneo da Kunsthalle Lissabon. Muitas texturas (dá a vontade de tocar em todas as obras), cores extravagantes e um quê de caseiro são características dos trabalhos assinados pelo trio. Mais do que uma coletiva, eles fizeram uma grande instalação, e daí o título Rocambole: todas as suas ideias foram batidas num liquidificador e resultaram num só bolo torcido e recheado.

O convite da Kunsthalle ao Pivô para a ocupação “comemora” 10 anos de vida do espaço lisboeta: até 2020, a Kunsthalle suspendeu sua programação e cedeu seu espaço a quatro instituições internacionais (as próximas ocupações serão da romana CURA, da parisiense Kadist e do Institute of Contemporary Art, da Filadélfia). Fundadora e diretora artística do Pivô, Fernanda Brenner conta, em entrevista, sobre o espaço que está entre os mais agitados e estimulantes projetos artísticos paulistanos.


 

Por Julia Flamingo

 

 

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JF: Uma das instituições brasileiras que mais ouço falar nas rodas de conversas sobre arte em Portugal é o Pivô. Isso é fruto do seu esforço e da equipe em colocar o Pivô no cenário internacional da arte. Quais foram os passos certos que vocês deram para que isso acontecesse?

FB: Desde o início do projeto, nos preocupamos em criar um diálogo internacional contínuo, através de parcerias institucionais e de uma comunicação orientada para isso. Todo o conteúdo do Pivô é bilíngue e sempre buscamos estabelecer relações entre artistas brasileiros e estrangeiros no programa de exposições e na residência. Recebemos muita gente do mundo todo no espaço e acho que são esses os melhores “porta-vozes” do projeto. Nosso site e os media sociais são bem importantes para esse fim, tentamos replicar o máximo possível não só conteúdo, mas a dinâmica do espaço em nossas plataformas digitais. Temos um blog, um canal de vídeo e somos bastante ativos nas redes sociais. Nos últimos anos tenho feito uma série de falas públicas, seminários e conversas sobre o modelo institucional do Pivô fora do Brasil e nessas atividades conheci vários dos nossos interlocutores e parceiros, a Kunsthalle Lissabon é um exemplo. 


JF: O que mudou nas intenções e programação do Pivô desde quando ele foi inaugurado, em 2012?

FB: As intenções seguem as mesmas. Desde de 2012, trabalhamos em equipe para criar um espaço permanente de interlocução e produção de conteúdo original em arte contemporânea. Conceber, viabilizar e executar o programa segue sendo um desafio, mas ao longo dos anos fomos aperfeiçoando processos e criando as condições de trabalho para desenvolver projetos e receber um grande número de artistas no espaço. Hoje o espaço, que foi por muito tempo uma ruína, está complemente ocupado e isso foi um processo gradual que envolveu muita gente. 


JF: De que maneira as mudanças de governo influenciaram o funcionamento e a sustentabilidade do Pivô?

FB: Ainda é cedo para entender os impactos diretos na economia do espaço, mas certamente ajustaremos nossa programação e funcionamento para esse cenário tão complexo. Manter o espaço funcionando plenamente com uma programação consistente é um enorme desafio, especialmente em face a um governo que ameaça a liberdade de pensamento e ação de agentes culturais. 


JF: Muitos espaços de arte vêm fechando em São Paulo, frente à dificuldade de se manterem, receberem público, apostarem em divulgação. Nesse sentido, qual é a fórmula do sucesso do Pivô?

FB: Não sei bem o que isso quer dizer. Não tem formula e acho que a ideia de “sucesso” em arte é muito problemática. O Pivô tem conseguido trabalhar continuamente em manter uma programação regular, mas nada garante o próximo ano. Eu diria que lidamos criativamente com as adversidades financeiras e organizacionais de um projeto como esse. Cada nova exposição pede um tipo de estrutura, cada residência se articula à sua maneira e, para sobreviver, reinventamos a economia interna continuamente. Isso exige uma energia enorme e o envolvimento de muita gente. Hoje estamos trabalhando para ter mais estabilidade institucional, mas ainda é um longo processo. Fazer isso sem colocar em risco a agilidade de produção que sempre tivemos e a liberdade de criação artística que damos aos artistas é uma equação super complicada.

 
JF: O Pivô é tido como um espaço independente, segundo a comunicação institucional. Mas, sabemos que as ligações com as galerias paulistanas são estreitas. Muitas das programações do Pivô só acontecem por conta do apoio das galerias - sendo nas exposições, no leilão (quando as galerias deixam de ganhar sua parte nas vendas para oferecer a quantia ao Pivô, junto ao artista), ou nos jantares beneficentes bancados pelos galeristas (que são quem compram ingressos). Pode me explicar porque sustentar tal título?

FB: A sua descrição do envolvimento das galerias é bastante equivocada. Somos uma instituição autonóma, auto-gerida e sem fins lucrativos. Nossa programação funciona independente de galerias e é financiada por meio de uma combinação de diversas receitas (leis de incentivo, parcerias institucionais, doações diversas, programa de múltiplos, eventos, leilão...). Quando os artistas têm galerias, às vezes contamos com algum apoio logístico, de comunicação ou mais raramente em produção de obras novas– e isso em geral é um parte pequena do orçamento da exposição - como acontece na grande maioria das instituições e museus, não só no Brasil.
As galerias não se envolvem no conteúdo do programa e nunca tivemos uma exposição totalmente bancada por uma galeria. A conversa do leilão é com os próprios artistas, que são convidados pela equipe de curadoria a contribuir com uma obra, porque têm uma relação com o projeto. É uma rede de colaboração entre os artistas e o espaço, não mediada por galerias. Algumas galerias internacionais e de São Paulo são mantenedoras do Pivô, assim como colecionadores, entusiastas do programa e empresas. E o jantar beneficente tem ingressos vendidos para quem quiser comprar e, claro, algumas galerias compram convites para apoiar o projeto, como fazem em todos os jantares beneficentes de instituições de arte de São Paulo. 


JF: Seguindo a pergunta anterior: é possível que um espaço de arte seja realmente independente atualmente, num país como o Brasil?

FB: Eu teria que entender melhor o que você chama de “realmente independente”. Eu prefiro o termo autónomo e sim, é possível. Há vários jeitos de atuar dessa forma, em várias escalas e tenho visto soluções de sustentabilidade bastante interessantes. Fazer um espaço na escala do Pivô é complicado, mas seguimos existindo e criando modelos para viabilizar projetos e manter nosso espaço físico em pleno funcionamento, … assim como a Casa do Povo, que tem uma estrutura parecida. Há projetos menores, temporários e vários coletivos inventando maneiras de funcionar mesmo sem políticas públicas consistentes ou incentivos diretos. 


JF: Agora sobre a ocupação do Pivô na Kunsthalle Lissabon: quais são os pontos em comum entre vocês? No texto de apresentação da exposição “Rocambole”, você fala principalmente sobre o potencial de reunião e conversa, que são prezados por ambos espaços. Além disso, o que aproxima vocês em questões práticas como programação, nas diretrizes e objetivos dos programas, na maneira como vocês entendem o papel da arte?

FB: Nós discutimos bastante o impacto que um projeto como esse pode ter em seu próprio contexto, na cena local. A Kunthalle Lissabon nasceu num momento de crise em Portugal, em que havia pouca troca internacional naquele cenário, e o Pivô nasceu num momento de otimismo económico no Brasil, e também com o objetivo de dar suporte a uma cena local em ebulição e abrir possibilidades de diálogo internacional contínuo. Apesar de terem começado em cenários distintos, os objetivos iniciais dos projetos estão alinhados. Do ponto de vista curatorial, nos aproximamos bastante da Kunthalle na opção por trabalhar essencialmente com projetos individuais inéditos, em que há um longo diálogo com os artistas que culmina em projetos que muito provavelmente não aconteceriam em outro contexto. A Kunthalle advoga pela ideia de hospitalidade radical e eu acho esse conceito extremamente interessante. É algo em que pensamos constantemente no programa de residências e na articulação do programa de exposições.

 

 

 

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“Rocambole”
Kunsthalle Lissabon
23/02-27/04/19
https://www.pivo.org.br/