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SNAPSHOT. NO ATELIER DE...




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“Brick Cityâ€, Instalação. Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.


Improv w/ Triangles #4, Técnica mista s/ tela, 202 x 186cm, 2015. Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.


“Rosto Queimado†, madeira queimada e cortada, 124 x 95cm, 2018. Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.


“O fim da Candongaâ€, acrílico s/ tela, 130 x 160cm, 2018. Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.


Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.


Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.


Cortesia da Galeria MOVART - arte em movimento.

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Délio Jasse



Nástio Mosquito



José Pedro Cortes




ANGEL IHOSVANNY CISNEROS

ADRIANO MIXINGE


 

O dia ensolarado não prenunciava que fossemos ter uma entrevista tão rica quanto sincera e surpreendente: a gênese da formação e gosto do artista pelas artes, a prática artística como instrumento de comunicação, a natureza morta na origem da formação das suas percepções estéticas, a vídeo-animação como recurso criativo alternativo aos mais convencionais, a irrelevância da raça para a análise e conhecimento da obra artística dos sul-africanos William Kentridge e Kendell Geers estiveram no centro de uma conversa distendida, de uma familiaridade inesperada por causa dos vínculos do entrevistador e do entrevistado com Cuba.

Houve mais: os desentendimentos e a frieza entre as galerias angolanas até mesmo, em Cape Town, quando foram em representação do país, os perigos da mercantilização das obras de arte e da secundarização do artista, bem como as características artísticas e estéticas da sua obra mais recente que, segundo afirma, “situa-se na ponte entre o crescimento e a morte da cidade” são os principais temas abordados pelo artista angolano Ihosvanny Cisneros, nesta entrevista com o site Arte Capital, realizada na passada terça-feira, 19 de Fevereiro, numa das salas do Memorial Dr. António Agostinho Neto, à Nova Marginal, em Luanda.

 


Por Adriano Mixinge

 

 

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Adriano Mixinge (A.M.): Como e até onde é que recorda o seu interesse pela arte?

Ihosvanny Cisneros (I.C.): O meu interesse pela arte começou muito cedo. Como eu sempre fui uma pessoa um pouco tímida, a arte como linguagem e forma de expressão interessou-me desde que eu era criança. A prática de arte serviu-me como um instrumento para comunicar e para expressar o meu pensamento, sem ter que utilizar as palavras. Comecei a desenhar desde pequeno.
Desde a pré-classe, na escola, tenho memória que, no primeiro contacto que tive com os lápis, ao usá-los procurei desenhar formas e, de certa forma, isto me diferenciava dos outros alunos da sala. Os professores não precisavam nem de me apoiar, porque eu já tinha certa destreza e, desde então, fui utilizando-os como uma ferramenta para exteriorizar o meu modo de ser e de articular a minha relação com o mundo.


A.M: Tem algum antecedente familiar, pessoas que na sua família se tenham dedicado e interessado de uma maneira especial pela arte e pela cultura?

I.C: Nós tínhamos em nossa casa um quadro, uma natureza morta, que foi pintado por um primo que sofreu e faleceu de asma muito jovem. Este primo da minha mãe teve acesso a escola e formou-se na escola de arte, lá em Cuba.


A.M: Nós sabemos que tens uma origem mista, com um lado da família angolana e o outro cubano.

I.C: Este primo era cubano. Afro-cubano.


A.M: Ele esteve aqui em Angola?

I.C: Não, ele nunca esteve cá.


A.M: Mas, o quadro estava em vossa casa?

I.C: Era uma natureza morta, se calhar era um exercício da escola.


A.M: Eu considero que, uma parte da tua obra pictórica é uma reapropriação e renovação do tema da natureza morta. Mas, sobre isso falaremos mais adiante. Acho que, depois, podemos voltar para este tema. Então, o teu nome completo é Angel…

I.C: Angel Ihosvanny Cisneros Felicidade. Felicidade é o meu último nome e eu gosto de dizer que sou o anjo da felicidade (Risos).


A.M: (Risos). Quem entre os teus pais era o cubano, a mãe e ou o pai?

I.C: A minha mãe é que era a cubana. O meu pai era angolano, natural do Moxico.


A.M: Como é que eles se conheceram?

I.C: Ele foi lá estudar, conheceu a minha mãe e casaram-se depois. O casamento foi por procuração.


A.M: Tu és filho único?

I.C: Não, eu tenho duas irmãs com dupla nacionalidade. São pragmáticas: aqui em Angola dizem que são cubanas e lá em Cuba elas dizem que são angolanas.


A.M: Qualquer interessado que hoje googlear o seu nome, encontrará imediatamente as suas curta-metragens na plataforma digital Vimeo: qual é o lugar que os filmes ocupam na sua trajectória inicial? Ou já são resultado de um período mais maduro?

I.C: Antes devo dizer que, foi já aqui em Angola que estabeleci, pela primeira vez, uma relação mais profissional com as artes. A falta de material convencional de arte obrigou-me a procurar outras formas de me expressar: o vídeo foi o meio mais imediato e como tal, na verdade, era a extensão dos meus desenhos, porque comecei primeiro a fazer vídeo-animações. Tentei ligar o vídeo à pintura, ligá-los esteticamente, mas, ao mesmo tempo, fugindo um pouco do que pintava na época, em termos do tipo de imagens. Pintando sou um pouco figurativo, mas, no vídeo, tento ser um bocadinho abstracto. Agora tento fazer a junção, mostrando o figurativo do abstracto e o abstracto do figurativo.


A.M: Quer dizer que, as vídeo-instalações para ti são uma interface que utilizas para explorar problemas identitários e estéticos ao mesmo tempo? Mas, estéticos que identitários?

I.C: A estética de certa forma revela uma identidade. É, também, uma forma de estar: através da imagética procuro pintar, procuro aspectos na paisagem que têm alguma relação com o discurso que quero transmitir.


A.M: De todas as formas, as vídeo-instalações e as vídeo-animações são, geralmente, suportes mais colectivos do que individuais. A minha pergunta é: estás mais cómodo na solidão do teu atelier ou neste exercício colectivo de fazer as vídeo-instalações e as vídeo-animações?

I.C: Hoje em dia, como é que eu posso dizer, trabalhamos bastante em colectivo e gostamos de definir o lugar e o papel exacto do artista. Mas, o meu trabalho é mais artesanal: eu gosto da confeição e do controlo da matéria que utilizo. E o vídeo, também, tornou-se não propositadamente qualquer coisa que eu gosto de estar com ele; defino-me como alguém que gosta de estar com a sua obra, senti-la e ou até mesmo sofrer com ela. O vídeo tornou-se também uma prática solitária para mim. Como lhe disse, não era assim tão fácil obter os materiais, obrigou-me a utilizar o conceito low cost/high tech.
Eu tive a possibilidade de aproveitar as ferramentas de edição, que outras pessoas me deram. Acho que uma das coisas que me fez ser artista é esta, que podes controlar a obra desde a criação e ou escolha dos materiais até à sua apresentação. E isso foi bastante importante: eu gosto do processo de criação em si e desfrutar dele, é a parte com a qual eu vou ficar, porque o resultado depois é algo que se independentiza de mim, fica à mercê do público que depois tem outros olhares. É verdade que eu, também, gosto de explorar o olhar do público, que mostra diferentes visões e diferentes opiniões.


A.M: Sabemos que vives em Barcelona, mas, acabas de regressar de Cape Town. Tens estado atento àquelas que são de um modo geral as produções artísticas do mundo? Mas, também, as daqui, da África subsaariana? Há artistas que te interessam especialmente? Quais são os artistas que te chamam mais atenção? Há discursos que te interessam explorar mais?

I.C: Entre os artistas que mais me influenciaram pela sua história, pelo processo criativo que dá lugar às suas obras estão, certamente, o William Kentridge e o Kendell Geers. Gosto do discurso deles e muitos outros cujos nomes agora não se me ocorrem.


A.M: O William Kentridge e o Kendell Geers, na verdade, são dois artistas brancos sul-africanos que, entretanto, têm um tratamento estético e formal muito apurado. O Kendridge por causa desta coisa dele controlar muito bem todo o processo, todos os passos no processo de criação e o Kendell, porque ele é um pouco mais provocador.

I.C: Kendell Geers na sua provocação, mas também na sua estética e a sua forma de procurar a sua identidade africana. O facto de eles serem brancos é irrelevante. E se não lhes conheceres, podes pensar até que eles até que são negros, wherever.


A.M: Eu conheci-os bem, quando eu tinha 27 anos e fui o comissário da participação de Angola na IªAfricus Bienal de Joannesburgo. Conheco-os bem os dois: tanto ao nível do discurso que como pessoas; por isso, o que estás a dizer sobre a irrelevância da raça é importante.

I.C: O facto de falar de raça, acho eu que aqui não sei se acrescenta qualquer coisa.


A.M: Não, não acrescenta nada. Antes pelo contrário diminui e desvirtua o foco da nossa reflexão.

I.C: Diminui, é. Acho que a sua pesquisa a propósito da sua africanidade e a sua forma, também, de levá-la por outros caminhos, pelos caminhos que eles sentem, acho que é o importante ter em conta.


A.M: Concordo plenamente contigo. Mas, como é que correu a Feira Investec agora em Cape Town? Gostaste da experiência?

I.C: Gostei da experiência, embora o choque que as feiras do género normalmente provocam, eu já esperava. Foi um pouco mais uma oportunidade para fazer relações, conhecer as pessoas, conhecer os meios artísticos de Cape Town, de um modo geral, para ter uma noção não sõ da criação, mas, também, da feira em si. A única coisa que lamento é que havia três galerias angolanas e nenhuma delas comunica com as outras, não há uma interacção, é uma coisa wow!


A.M: É um pouco estranho.

I.C: Sim, é um bocado estranho, neste aspecto. Mas, lá, de um modo geral, fui bem recebido de uma forma agradável e, também, a energia da cidade muda completamente.


A.M: A falta de relações entre as galerias, em Angola, é um problema que poderia merecer uma reflexão de outro gênero, mas, eu acho que o importante aqui para nós, nesta entrevista, é mesmo só o teu percurso. Os galeristas podem não relacionar-se entre si, mas os artistas sim.

I.C: Sim, eu fui para todas outras galerias angolanas sem problemas; saía de uma e pulava para a outra, sem problemas, porque me interessa. Eu também funcionava como ponte e como embaixador para uni-las a todas.


A.M: Online, eu vi uma fotografia tua com o António Ole que, no entanto, participaram representados por galerias diferentes.

I.C: Sim, estive com o António Ole, um artista que eu respeito muito e com o que, certamente, dialogamos bastante. Acho que deveria merecer outro tratamento. Mas, foi agradável estar aí e ver como tudo funciona e como, muito particularmente, funciona o circuito de arte, embora, como sempre disse o Miquel Barceló, para o artista é sempre frustante estar nas feiras e ver como a sua obra está a ser mercantilizada, de uma forma ou de outra.


A.M: Deste ponto de vista não estiveste muito cômodo?

I.C: Até estive, fui já mentalizado. Mas, o mais traumatizante foi quando anos atrás fui à Veneza, o choque ali foi pior. Ver como funciona o mercado de arte e todas as questões políticas que o envolvem a volta dos discursos artísticos. O artista era o epicentro do pavilhão, mas as questões políticas abafavam o discurso pessoal do artista. Então, desta vez, fui já um bocado vacinado para esta feira e não sofri. Antes pelo contrário: a interacção directa com o público foi o mais estimulante. Falar com os estudantes, que faziam perguntas pertinentes, criando alguma discussão, nos fazia dizer: wow! Eles começavam a fazer perguntas de uma forma que permitia interagir, o que é bom para o artista que, de certa forma pode, naqueles instantes, contribuir para uma maior elevação da educação deles.


A.M: Quer dizer que o que lhes interessou foi mesmo o teu trabalho, por isso, vamos falar dele: nesta fase do teu trabalho, especificamente, na sua obra pictórica, a cidade, as naturezas mortas e as cores, as cinzas e as mais coloridas se interlaçam para por vezes provocar um efeito de calma e tranquilidade e outras de caos e inquietação. O que é que lhe interessa realmente transmitir e ou levar o espectador a reflexionar face as tuas criações pictóricas?

I.C: Sobre as pinturas há que dizer que, há uns anos atrás, eu comecei a trabalhar mais sobre a paisagem urbana e a periferia de Luanda, os musseques, não só pela necessidade de sentir Luanda, mas também porque depois de longas temporadas fora da cidade, quando voltasse havia sempre mudanças. Pintar a cidade era uma forma de acompanhar essas mudanças e, também, refletir sobre o rumo que vamos levando, que a cidade vai tendo arquitectonicamente falando, o que estamos construindo para o futuro. Então, senti que estávamos a copiar um padrão que, praticamente, já faliu.
Nas primeiras exposições que trabalhei com este projecto de resgatar a cidade, fiz uma ponte entre o crescimento e a morte das cidades, já que têm alguma ligação. O caos das construções está intimamente relacionado com as demolições e as pedras, e quiz encurtar o caminho e dizer, para quê que servem estes todos edifícios vazios? E, por outro lado, através deles, interrogar-me a mim mesmo. Para quê que serve tantos litígios, tanta especulação imobiliária se o que estamos é criando edifícios e indivíduos e tanto estes edifícios como os individuos depois acabarão nem sendo utilizados, nem uns nem os outros. Para quê especular tanto com o concreto?


A.M: Desta vez, em Luanda, tu ficarás muito tempo ou daqui a nada voltas já para Barcelona?

I.C: Eu fico mais dez dias cá, em Luanda. Gostaria de ficar muito mais e continuar a explorar o choque do regresso e matar saudades.