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© Cortesia da equipa S/ Título


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Délio Jasse



Nástio Mosquito



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S/ TíTULO

CATARINA REAL


 

S/ Título é um projecto editorial dedicado à divulgação crítica das artes, com foco em novos artistas ou práticas com menor visibilidade. A primeira edição do jornal foi lançada em Setembro de 2021, a equipa de contribuidores é agora composta por dezasseis pessoas, e será em breve lançada a quinta edição. Um projecto independente e resistente “De, e pela arte. De, e pela cultura.”, dizem-nos.

 

Por Catarina Real

 


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CR: Peço-vos, primeiro, para que descrevam o contexto de aparecimento deste projecto.

ST: A equipa fundadora do S/ Título era composta por quatro pessoas, e foi no decorrer de um Mestrado na Faculdade de Belas Artes de Lisboa que três de nós estavam a frequentar — a cláudia, a Helena e a Márcia —, que começou o diálogo. Surgiu em consequência de uma de muitas conversas, numa certa frustração por parte da cláudia e da Helena (ambas artistas) relativa a candidaturas com regime de open call para exposições, publicações, residências e divulgação de trabalhos. Esta insatisfação partia, em grande parte, do método dessas candidaturas, que resultava em inúmeras dessas mesmas e em raramente ser-se aceite. De ser um sistema fechado e difícil de penetrar.
Em tom de brincadeira, a Márcia sugeriu fazer-se uma revista ou um outro tipo de publicação sobre arte emergente. Sem dar por isso já estavam ideias a serem apontadas no papel. Estávamos três pessoas nisto e íamos certamente precisar de um designer. Aí o Luís entrou na equação, por recomendação da cláudia. A partir daí foi uma bola de neve, que aconteceu decorrente da nossa vontade de mudança e do querer e fazer acontecer.
Tivemos a primeira reunião oficial em julho de 2021 e a partir daí desenvolvemos os conceitos e a estrutura da publicação, passando nomeadamente a ideia inicial de ‘revista’ para a ideia fulcral de ‘jornal’. Em setembro do mesmo ano lançámos a nossa primeira edição.

 

CR: É importante sabermos quem são as caras por detrás deste projecto?, ou apenas quantas mãos contribuem para ele? Como encaram a autoria face a S/ TÍTULO?

ST: Inicialmente era algo que estava planeado não ser divulgado, queríamos ter anonimato total. No entanto, a certo ponto, quando percebemos que omitir a nossa identidade poderia exigir ainda mais de nós, assumimos o projeto como nosso e percebemos a importância de também sermos reconhecides pelo nosso trabalho. Sem nós o projeto não existe, e mesmo não o estando a fazer necessariamente pelo reconhecimento, estamos nele incluídes. Não fazemos questão de nos divulgarmos como indivíduos, mas apresentamo-nos pessoalmente nos eventos que proporcionamos, para gerar uma conversa e uma partilha de ideias que é necessária, deixando tudo o resto para es artistas, pois sem elus o projeto S/ Título também não existiria. Desde o início que nos vemos e assumimos como uma plataforma para quem não a tem. Focarmo-nos em nós, equipa, como primeira etapa, tornava-se contraintuitivo e não nos acrescentava nada, pois só queremos ser esta ferramenta, este “entre”, um meio para atingir determinado fim. Temos os nossos nomes nos créditos dos respetivos textos e nas fichas técnicas, de modo a receber mérito por algo que construímos, como qualquer outra pessoa fora do projeto terá sempre que fizer parte do S/ Título.
Começámos com quatro pessoas, hoje somos dezasseis, prestes a criar uma Associação. Temos cada vez mais mãos, todas elas são importantes, válidas e necessárias para que o projeto continue, mesmo que o foco continue a ser a divulgação e a criação de uma plataforma e de uma comunidade.

 

CR: Quanto à organização por secções; o que é que cada uma das secções tenta apresentar, e colmatar a falta de divulgação e acesso?

ST: A estrutura do jornal S/ Título começa, geralmente, com o separador “Em exibição”, onde se pode observar uma análise, que pode ou não ser crítica, a uma exposição, evento ou festival. Os separadores “Perfil” e “Foco” são ambos ligados à apresentação des artistas, sendo que no primeiro há uma entrevista ou conversa com es mesmes (dando-se a conhecer desde processos artísticos ao trabalho em estúdio, por exemplo), e no segundo é e artista que se dá a conhecer a si próprie de maneira breve (com uma pequena descrição e apresentação de peças em forma de catálogo). O “Sintoniza” é o separador que traz consigo a arte sonora e a música, expondo artistas sonores ou bandas de maneira sucinta, apresentando um dos seus projetos em forma de recomendação (com link para as respetivas plataformas). Temos ainda os separadores “Crónica” e “Entrelinhas” que se dedicam à arte escrita e à arte com a palavra, apresentando assim obras, parcialmente ou na sua íntegra. De crónicas, a prosa, poesia, ou outras estruturas híbridas. Ao chegar-se ao fim do jornal, surge o separador “Páginas Amareladas”, inspirado nos antigos classificados, que tem como objetivo a divulgação de espaços (casas d’arte, estúdios, coletivos, galerias, etc.) e a divulgação de freelancers e outras pessoas prestadoras de serviços na área da cultura (bailarines, atorus, designers, entre outres) a partir de uma fidelização publicitária.
O S/ Título encerra-se, normalmente, com “Passa-Tempos” e “A Fechar”, que são separadores que dão a conhecer artistas cujo trabalho, de alguma maneira, se identifica com a ideia de jogo, meteorologia, anedota, banda-desenhada (entre outros), apresentando um dos seus projetos que pode ou não ser feito exclusivamente para o S/ Título.
A divisão por separadores foi influenciada pela estrutura de um jornal convencional: há artigos mais pequenos, outros maiores, crónicas, entrevistas, secção de música e passatempos. Cada prática artista tem uma forma específica de ser divulgada por isso tentamos que cada separador seja utilizado da melhor maneira, e que cada um tenha uma forma particular de atenção. Nunca com o objetivo de criar uma divisão, mas sim com o objetivo de criar uma linguagem que se adeque a cada prática e a cada artista que envolvemos.

 

CR: Talvez queiram referir alguns/algumas das artistas que já foram referenciados nas vossas edições, numa ou noutra secção, e partilhar as características que os unem?

ST: Um dos nossos princípios é que es artistas que escolhemos para cada edição não necessitem de apresentar, à partida, nada em particular que es una. O que es liga é precisamente o facto de serem todes artistas independentes e emergentes, que estão a querer dar a conhecer a sua arte nas mais diversas vertentes. Quando criamos uma nova edição tentamos, geralmente, escolher artistas com práticas distintas, mas que de certa maneira (talvez mais intuitivamente) façam sentido umes com es outres, visual ou conceptualmente. Não há, no entanto, um ponto de partida que una de forma direta estes trabalhos. Um dos nossos objetivos desde o início foi o de nunca desenvolver uma edição ou uma exposição com princípios temáticos, para que deste modo não nos limitemos, nem a nós nem a artistas, em relação ao que incluir. Submeter es artistas a criar algo de novo que coincidisse com um tema em questão foi, precisamente, algo que nos proibimos de fazer.
A coerência e o fio condutor podem ser criados através de outras relações. Temos interesse em conectar artistas que à partida, ou aparentemente, não têm nada em comum. Assim que as suas obras são colocadas lado a lado podem ser descobertas e geradas inúmeras novas ligações, bem como novas significações.
O nome do próprio jornal parte desse princípio, bem como os títulos das exposições, ou a ausência deles. Não pretendemos rotular nem influenciar visões específicas, pelo menos até a este momento.

 

CR: Ao longo dos vossos números, e face ao esforço de abrir inclusive uma chamada aberta à participação, crêem ter vindo a abrir alguma brecha no elitismo do mundo da arte, o mesmo que referem como um factor motivação para início deste projecto?

ST: Optando por candidaturas espontâneas cortamos um pouco com o que poderá ser considerada a “norma” neste meio das publicações e oportunidades artísticas. No processo de seleção, fazemos somente uma triagem segundo alguns dos aspetos referidos anteriormente. Ao contrário de algumas open calls que abrem candidaturas a cada edição, tentamos, através do sistema de candidaturas espontâneas, não excluir quem não foi ainda escolhide, deixando a oportunidade de poderem ser selecionades para uma próxima edição. Acreditamos que o nosso processo não é de inclusão ou exclusão, mas sim um processo de seleção. Questionando sempre apenas o necessário, como nome de artista e de onde vem por exemplo. Nunca exigimos parâmetros específicos para a inscrição, pois cada pessoa tem uma maneira diferente e particular de apresentar o seu trabalho. Além disso, o nosso sistema de upload de portefólio permite que os ficheiros sejam alterados e substituídos com o tempo, ao invés de enviar novas versões constantemente. Redigir candidaturas específicas quando apenas queremos apresentar o nosso trabalho torna-se cansativo, e temos muita atenção a este ponto, para reduzir o esforço de o fazer.
Por norma, quando ume artista tenta a sua sorte numa publicação ou qualquer outra plataforma de exposição necessita de realizar uma considerável quantidade de trabalho prévio, de forma a ter um portefólio marcado pela presença em diversas exposições, às quais se atribui o reconhecimento do trabalho que e mesme realiza — o que o S/ Título proporciona é a anulação de todos esses parâmetros. Tentamos praticar aquilo que nunca vimos ser praticado connosco. Quando falamos em “combater o elitismo” trata-se de nos tornarmos este canal que consegue ligar ume artista a um espaço sem intermediários, que de outra maneira seria assumido como impossível. Sabemos que, nos tempos que correm, pode ser difícil para ume artista, sozinhe, ter credibilidade ao enviar um email a apresentar o seu trabalho e solicitar uma plataforma para o apresentar. Insistimos em tentar ser essa ponte e reforçar que tal realidade é possível.
Muitas portas nos são fechadas pela nossa inexperiência. Se não houver uma única porta aberta, que nos faz progredir, não chegamos a lado nenhum. O S/ Título tenta ser uma porta escancarada, uma oportunidade de exposição que esperemos que impulsione todo um outro conjunto de participações posteriores.

 

CR: Face ao que já conseguiram pôr de pé, quais são os vossos horizontes para o projecto?

ST: Como referido, começámos este projeto com quatro pessoas e hoje em dia somos dezasseis! Estamos no processo de transição para nos tornarmos uma Associação, e temos vindo a organizar eventos de modo a angariar fundos que cubram os custos desse mesmo processo. Queremos continuar a edição física do jornal, no entanto, ambicionamos ser mais do que isso, proporcionando eventos e outras formas de divulgação e exposição de artistas, oriundes de todo o espectro cultural. Para além disso, tencionamos focar-nos também na descentralização da arte e da cultura. Queremos abranger mais do que apenas a cidade de Lisboa (onde temos vindo exclusivamente a atuar e onde nos demos a conhecer até agora). Consideramos este ponto urgente e necessário; percorrer o país mostrando o máximo de artistas emergentes possível. Tencionamos, portanto, ir literalmente mais longe.

 

CR: Quais são as dificuldades que contam ter de encarar, e como seria o sistema em que elas não existiriam?

ST: Definitivamente a falta de apoios diretos. E, dentro dos poucos existentes, todo o protocolo, burocracia e condicionantes que a candidatura aos mesmos envolve. A falta de informação quanto às linhas de apoio, onde se é deixado em espera e sem respostas. Também a criação de um projeto onde aplicamos tempo e trabalho e onde não há retribuições monetárias para essa mesma criação inicial, e para quem dele faz parte. Tudo isto torna o percurso difícil e por vezes desmotivador.
Um sistema em que estas dificuldades não existissem seria, indubitavelmente, um sistema funcional e sustentável.
A quantidade de papelada que é necessária para ser concluído um processo de submissão de qualquer pedido de apoio é algo que ninguém nos ensinou a fazer. É necessária pesquisa e também várias conversas com quem já passou pelo mesmo processo e que foi aprendendo por tentativa e erro. Esta é uma das coisas que cremos que poderia facilmente ser simplificada. Poderia passar, por exemplo, por um questionário por parte dessas entidades, com perguntas diretas às quais responderíamos prontamente, e a partir das quais poderia ser marcada uma entrevista.
Sempre que temos de apresentar uma proposta, há um novo longo documento a ser escrito, documento esse que tem de ser redigido por alguém que está consciente das regras e do que estas envolvem, de modo a ser primeiramente considerado, e mais tarde realmente aprovado.
Só este procedimento por si só tem um custo, o que o torna contraprodutivo. No final, de forma que tenhamos hipótese de nos ser atribuído qualquer tipo de financiamento, precisamos de pagar a alguém para formular uma candidatura. Tudo isto, insistimos, apenas para nos certificarmos, sem garantias, que o projeto seja considerado para financiamento.
Torna-se cómica esta realidade. Qualquer proposta com uma estrutura diferente da expectável é imediatamente chumbada. Este é um processo que não nos é facilitado, e que na nossa visão tem, definitivamente, de ser revisto de forma a ser acessível às mais diversas práticas e projetos que figuram em todo o espectro das áreas culturais.
Também poderíamos referir a falta de entreajuda que sentimos; quem nos pode ajudar não tem paciência, tempo ou apenas disponibilidade, para tornar claros os procedimentos a serem seguidos. Sem alguém que saiba e que nos elucide, com quem aprendemos? Não é mesmo nada fácil criar um projeto neste país.

Apesar de tudo isto, e como forma de concluir, o S/ Título tentará permanecer, aqui, a fazer o que nos é possível. De, e pela arte. De, e pela cultura.