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JÚLIO CÉSAR DESTRUIU MESMO A GRANDE BIBLIOTECA DE ALEXANDRIA?2024-09-03![]() A lendária Biblioteca de Alexandria é uma das estruturas mais famosas do mundo antigo, ao lado das Pirâmides de Gizé, dos Jardins Suspensos da Babilónia e de outras maravilhas arquitetónicas descritas por poetas e filósofos há muito falecidos. E, no entanto, apesar da sua notoriedade, sabemos muito pouco sobre a Biblioteca – como foi feita, qual a sua dimensão ou mesmo quando foi destruída. Na verdade, temos apenas uma descrição sobrevivente do complexo, que nos foi transmitida pelo historiador e geógrafo grego Estrabão, que visitou a cidade costeira egípcia entre 30 e 25 a.C.. “O Museu faz parte dos palácios”, escreveu na ‘Geographia’. “Tem um passeio público e um local mobilado com assentos, e um amplo salão, onde os sábios, pertencentes ao Museu, tomam a refeição comum. Esta comunidade possui também bens em comum; e um sacerdote, anteriormente nomeado pelos reis, mas atualmente por César, preside ao Museu.” Os leitores modernos poderão perguntar-se por que razão Estrabão se refere à Biblioteca como um museu. Fá-lo não porque a Biblioteca albergasse artefactos antigos, embora muitos dos seus livros fossem, sem dúvida, antigos, mesmo quando comparados com a própria instituição. Em vez disso, a palavra denotava originalmente qualquer lugar de aprendizagem e engenho humano associado às Musas, as deusas-irmãs gregas da arte, da ciência e da inspiração divina. Embora não saibamos o ano exato em que a Biblioteca de Alexandria foi erguida, a sua construção é normalmente atribuída ao reinado de Ptolomeu I e Ptolomeu II. Estes faraós foram sucessores de Alexandre Magno, o conquistador macedónio que colocou grande parte da Ásia Menor, incluindo o Egito, sob o seu controlo. Devido à sua origem greco-macedónica, os historiadores suspeitam que muitos dos livros da Biblioteca de Alexandria terão sido escritos em grego. Quantos livros foram guardados dentro da Biblioteca é outro mistério duradouro. Um escritor judeu anónimo do século I a.C., visitando o Egipto na mesma época que Estrabão, afirmou que o complexo continha “todos os livros do mundo”, uma afirmação que, embora quase certamente uma hipérbole, fala da dimensão incomparável da Biblioteca. No mesmo texto, o autor afirma que a Biblioteca continha entre 200.000 e 500.000 livros, um testemunho da riqueza da literatura antiga que se perdeu no tempo. Felizmente, sabemos um pouco mais sobre a forma como a Biblioteca de Alexandria adquiriu os seus livros. Galeno, um médico grego que serviu Marco Aurélio entre outros imperadores romanos, escreveu que Ptolomeu (não sabemos qual) “estava tão ansioso por colecionar livros, que ordenou que os livros de todos os que para lá navegassem lhe fossem trazidos. Os livros foram depois copiados em novos manuscritos. Deu o novo exemplar aos proprietários, cujos livros lhe foram trazidos depois de terem navegado para lá, mas colocou o exemplar original na biblioteca com a inscrição ‘um [livro] dos navios’”. Reza a lenda que a Biblioteca foi destruída quando Júlio César invadiu o Egito para caçar o seu aliado que se tornou inimigo, Pompeu, o Grande. Envolvendo-se numa guerra civil entre a sua amante, Cleópatra, e o irmão desta, Ptolomeu XIII, o ditador incendiou os navios na baía de Alexandria, provocando um incêndio que, segundo o poeta romano Lucano, se alastrou ao resto da cidade: “O fogo também não caiu apenas sobre os navios: as casas perto do mar pegaram fogo com o calor que se espalhava, e os ventos atiçaram a conflagração, até que as chamas, atingidas pelo vendaval em turbilhão, correram sobre os telhados tão depressa quanto os meteoros que muitas vezes traçam um sulco no céu, embora não tenham nada de sólido para se alimentarem e queimarem apenas através do ar. Embora há muito aceite como facto, os historiadores modernos encontraram contradições em fontes antigas que lançam dúvidas sobre a culpabilidade de César. Por exemplo, um dos tenentes do ditador, Aulus Hirtius, disse que “Alexandria está quase completamente segura contra incêndios”, uma vez que os seus edifícios estavam em grande parte desprovidos de materiais inflamáveis, como a madeira. A descrição oferecida por Estrabão, que visitou Alexandria cerca de 20 anos depois de César, sugere que se a Biblioteca de Alexandria foi danificada ou destruída, foi rapidamente reconstruída. Na verdade, ao contrário do que se pensa, a biblioteca foi destruída e reparada várias vezes ao longo da história, incluindo (assim acreditam os historiadores) recentemente, em 642 d.C., quando os árabes muçulmanos invadiram o Egito. Para compensar a perda da grande biblioteca, a cidade de Alexandria construiu uma nova: a Bibliotheca Alexandrina, no valor de 220 milhões de dólares, com construção iniciada em 1995 e que se estende até 2002; a falecida cantora irlandesa Sinéad O’Connor atuou na cerimónia de abertura. Embora o original albergasse sobretudo manuscritos gregos, o seu sucessor espiritual, construído com o financiamento da Bibliothèque Nationale de França, contém cerca de 500 mil manuscritos franceses, sendo a sexta maior biblioteca francófona do mundo. A Biblioteca Alexandrina dificilmente é a instituição que foi a sua antecessora; o número do seu acervo é muito ultrapassado por instituições como a British Library, a maior do mundo, ostentando uma coleção de cerca de 200 milhões de itens. Ainda assim, há muito espaço para crescer: a nova biblioteca contém espaço nas prateleiras para cerca de oito milhões de volumes. E mais (olá, Estrabão!), contém nada mais nada menos que quatro museus. Fonte: Artnet News |