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DE ONDE VEIO O SALÃO DE PARIS

2024-06-13




Entre os problemas enfrentados por Napoleão III em 1863 estava uma legião de artistas mal-humorados. Naquele ano, o júri notoriamente conservador do Salão rejeitou dois terços dos trabalhos apresentados, enfurecendo devidamente nomes como Édouard Manet, Camille Pissarro e Paul Cézanne.

Sempre aspirante a populista, Napoleão sancionou o Salon des Refusés, permitindo que as próprias massas julgassem as 780 obras. Milhares de pessoas faziam isso todos os dias, esgotando o Palais de l’Industrie para discutir e ficar boquiabertos com os rejeitados do Salão. Embora amplamente ridicularizado, foi um espetáculo importante, afrouxando pela primeira vez o monopólio do establishment sobre a arte.

Esse controle já estava consolidado há muito tempo. Em 1648, Luís XIV, com nove anos, apoiou a formação da Academia Real de Pintura e Escultura a mando de Charles Le Brun. A sua função inicial era produzir artistas franceses que pudessem executar encomendas reais com um toque nacionalista – sem gastar mais com mestres flamengos ou italianos. O Salão foi uma consequência natural deste sistema.

A partir de 1667, a Academia realizou exposições esporádicas, permitindo aos seus membros apresentar os seus talentos a potenciais mecenas. Depois de transferir a sua corte para Versalhes em 1682, o Rei Sol designou uma secção do Louvre para a Academia. Os encontros tornaram-se mais formalizados e frequentes na década de 1720, após a mudança para o Salon Carré, sala retangular que dá nome à exposição.

Em 1737, o Salão foi aberto ao público e ofereceu um raro acesso à arte numa época anterior aos museus. As pinturas foram selecionadas por um júri de académicos com base numa hierarquia rígida. Primeiro vieram as pinturas históricas (pense em cenas bíblicas, grandes batalhas, mitologia clássica). Em seguida vieram os retratos (da realeza, naturalmente), depois as pinturas de género e as paisagens. A humilde natureza morta foi a última.

Cada centímetro do Salon Carré estava repleto de pinturas dispostas de acordo com esta hierarquia, uma cena agrupada que com o tempo se tornou o seu próprio tema pictórico. Realizado anualmente e posteriormente semestralmente, o evento fomentou o debate intelectual e produziu críticas de arte que com o tempo se espalharam pelos jornais do país.

A arte, no entanto, não estava fora das garras do espírito revolucionário que varria a França no final do século XIX e em 1893 a Academia foi abolida após a execução de Luís XVI. O Salão passou da supervisão real para a governamental e em 1795 foi aberto a todos os artistas, inclusive os de fora de França.

A École des beaux-arts que substituiu a Academia pode ter sido desvinculada da realeza, mas o Salão permaneceu governado por gostos conservadores. Durante grande parte do século XIX, o evento anual manteve-se a única oportunidade para jovens artistas obterem elogios e novos patrocinadores. Com o tempo, esse controle sobre o que era considerado “boa” arte produziu salões dissidentes.

Napoleão III abriu um precedente com o Salon des Refusés - repetido em 1874, 1875 e 1886. O Salon des Indépendents e o Salon d'Automne levaram o espírito ainda mais longe, dando nova importância ao trabalho que rompeu com a tradição em cor, composição e assunto.

Paris não olhou para trás. No início do século XX, o estatuto do Salão como árbitro do gosto artístico era uma memória que se desvanecia.


Fonte: Artnet News