Links

PERSPETIVA ATUAL


Lorenzo Monaco, A Virgem com o Menino (1400), Museu Thyssen-Bornemisza.


Diagrama incluído em 'Segregation of Form, Color, Movement, and Depth: Anatomy, Physiology, and Perception', de Margaret Livingstone and David Hubel, Science, 1988, pp. 740-749.

Outros artigos:

2024-03-04


PEDRO CABRAL SANTO


2024-01-27


NUNO LOURENÇO


2023-12-24


MAFALDA TEIXEIRA


2023-11-21


MARC LENOT


2023-10-16


MARC LENOT


2023-09-10


INÊS FERREIRA-NORMAN


2023-08-09


DENISE MATTAR


2023-07-05


CONSTANÇA BABO


2023-06-05


MIGUEL PINTO


2023-04-28


JOÃO BORGES DA CUNHA


2023-03-22


VERONICA CORDEIRO


2023-02-20


SALOMÉ CASTRO


2023-01-12


SARA MAGNO


2022-12-04


PAULA PINTO


2022-11-03


MARC LENOT


2022-09-30


PAULA PINTO


2022-08-31


JOÃO BORGES DA CUNHA


2022-07-31


MADALENA FOLGADO


2022-06-30


INÊS FERREIRA-NORMAN


2022-05-31


MADALENA FOLGADO


2022-04-30


JOANA MENDONÇA


2022-03-27


JEANNE MERCIER


2022-02-26


PEDRO CABRAL SANTO


2022-01-30


PEDRO CABRAL SANTO


2021-11-22


MANUELA HARGREAVES


2021-10-28


CARLA CARBONE


2021-09-27


PEDRO CABRAL SANTO


2021-08-11


RITA ANUAR


2021-07-04


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-05-30


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2021-04-28


CONSTANÇA BABO


2021-03-17


VICTOR PINTO DA FONSECA


2021-02-08


MARC LENOT


2021-01-01


MANUELA HARGREAVES


2020-12-01


CARLA CARBONE


2020-10-21


BRUNO MARQUES


2020-09-16


FÁTIMA LOPES CARDOSO


2020-08-14


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-07-21


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-25


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-06-09


PEDRO CABRAL SANTO E NUNO ESTEVES DA SILVA


2020-05-21


MANUELA HARGREAVES


2020-05-01


MANUELA HARGREAVES


2020-04-04


SUSANA GRAÇA E CARLOS PIMENTA


2020-03-02


PEDRO PORTUGAL


2020-01-21


NUNO LOURENÇO


2019-12-11


VICTOR PINTO DA FONSECA


2019-11-09


SÉRGIO PARREIRA


2019-10-09


LUÍS RAPOSO


2019-09-03


SÉRGIO PARREIRA


2019-07-30


JULIA FLAMINGO


2019-06-22


INÊS FERREIRA-NORMAN


2019-05-09


INÊS M. FERREIRA-NORMAN


2019-04-03


DONNY CORREIA


2019-02-15


JOANA CONSIGLIERI


2018-12-22


LAURA CASTRO


2018-11-22


NICOLÁS NARVÁEZ ALQUINTA


2018-10-13


MIRIAN TAVARES


2018-09-11


JULIA FLAMINGO


2018-07-25


RUI MATOSO


2018-06-25


MARIA DE FÁTIMA LAMBERT


2018-05-25


MARIA VLACHOU


2018-04-18


BRUNO CARACOL


2018-03-08


VICTOR PINTO DA FONSECA


2018-01-26


ANA BALONA DE OLIVEIRA


2017-12-18


CONSTANÇA BABO


2017-11-12


HELENA OSÓRIO


2017-10-09


PAULA PINTO


2017-09-05


PAULA PINTO


2017-07-26


NATÁLIA VILARINHO


2017-07-17


ANA RITO


2017-07-11


PEDRO POUSADA


2017-06-30


PEDRO POUSADA


2017-05-31


CONSTANÇA BABO


2017-04-26


MARC LENOT


2017-03-28


ALEXANDRA BALONA


2017-02-10


CONSTANÇA BABO


2017-01-06


CONSTANÇA BABO


2016-12-13


CONSTANÇA BABO


2016-11-08


ADRIANO MIXINGE


2016-10-20


ALBERTO MORENO


2016-10-07


ALBERTO MORENO


2016-08-29


NATÁLIA VILARINHO


2016-06-28


VICTOR PINTO DA FONSECA


2016-05-25


DIOGO DA CRUZ


2016-04-16


NAMALIMBA COELHO


2016-03-17


FILIPE AFONSO


2016-02-15


ANA BARROSO


2016-01-08


TAL R EM CONVERSA COM FABRICE HERGOTT


2015-11-28


MARTA RODRIGUES


2015-10-17


ANA BARROSO


2015-09-17


ALBERTO MORENO


2015-07-21


JOANA BRAGA, JOANA PESTANA E INÊS VEIGA


2015-06-20


PATRÍCIA PRIOR


2015-05-19


JOÃO CARLOS DE ALMEIDA E SILVA


2015-04-13


Natália Vilarinho


2015-03-17


Liz Vahia


2015-02-09


Lara Torres


2015-01-07


JOSÉ RAPOSO


2014-12-09


Sara Castelo Branco


2014-11-11


Natália Vilarinho


2014-10-07


Clara Gomes


2014-08-21


Paula Pinto


2014-07-15


Juliana de Moraes Monteiro


2014-06-13


Catarina Cabral


2014-05-14


Alexandra Balona


2014-04-17


Ana Barroso


2014-03-18


Filipa Coimbra


2014-01-30


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2013-12-09


SOFIA NUNES


2013-10-18


ISADORA H. PITELLA


2013-09-24


SANDRA VIEIRA JÜRGENS


2013-08-12


ISADORA H. PITELLA


2013-06-27


SOFIA NUNES


2013-06-04


MARIA JOÃO GUERREIRO


2013-05-13


ROSANA SANCIN


2013-04-02


MILENA FÉRNANDEZ


2013-03-12


FERNANDO BRUNO


2013-02-09


ARTECAPITAL


2013-01-02


ZARA SOARES


2012-12-10


ISABEL NOGUEIRA


2012-11-05


ANA SENA


2012-10-08


ZARA SOARES


2012-09-21


ZARA SOARES


2012-09-10


JOÃO LAIA


2012-08-31


ARTECAPITAL


2012-08-24


ARTECAPITAL


2012-08-06


JOÃO LAIA


2012-07-16


ROSANA SANCIN


2012-06-25


VIRGINIA TORRENTE


2012-06-14


A ART BASEL


2012-06-05


dOCUMENTA (13)


2012-04-26


PATRÍCIA ROSAS


2012-03-18


SABRINA MOURA


2012-02-02


ROSANA SANCIN


2012-01-02


PATRÍCIA TRINDADE


2011-11-02


PATRÍCIA ROSAS


2011-10-18


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-09-23


MARIA BEATRIZ MARQUILHAS


2011-07-28


PATRÍCIA ROSAS


2011-06-21


SÍLVIA GUERRA


2011-05-02


CARLOS ALCOBIA


2011-04-13


SÓNIA BORGES


2011-03-21


ARTECAPITAL


2011-03-16


ARTECAPITAL


2011-02-18


MANUEL BORJA-VILLEL


2011-02-01


ARTECAPITAL


2011-01-12


ATLAS - COMO LEVAR O MUNDO ÀS COSTAS?


2010-12-21


BRUNO LEITÃO


2010-11-29


SÍLVIA GUERRA


2010-10-26


SÍLVIA GUERRA


2010-09-30


ANDRÉ NOGUEIRA


2010-09-22


EL CULTURAL


2010-07-28


ROSANA SANCIN


2010-06-20


ART 41 BASEL


2010-05-11


ROSANA SANCIN


2010-04-15


FABIO CYPRIANO - Folha de S.Paulo


2010-03-19


ALEXANDRA BELEZA MOREIRA


2010-03-01


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-02-17


ANTÓNIO PINTO RIBEIRO


2010-01-26


SUSANA MOUZINHO


2009-12-16


ROSANA SANCIN


2009-11-10


PEDRO NEVES MARQUES


2009-10-20


SÍLVIA GUERRA


2009-10-05


PEDRO NEVES MARQUES


2009-09-21


MARTA MESTRE


2009-09-13


LUÍSA SANTOS


2009-08-22


TERESA CASTRO


2009-07-24


PEDRO DOS REIS


2009-06-15


SÍLVIA GUERRA


2009-06-11


SANDRA LOURENÇO


2009-06-10


SÍLVIA GUERRA


2009-05-28


LUÍSA SANTOS


2009-05-04


SÍLVIA GUERRA


2009-04-13


JOSÉ MANUEL BÁRTOLO


2009-03-23


PEDRO DOS REIS


2009-03-03


EMANUEL CAMEIRA


2009-02-13


SÍLVIA GUERRA


2009-01-26


ANA CARDOSO


2009-01-13


ISABEL NOGUEIRA


2008-12-16


MARTA LANÇA


2008-11-25


SÍLVIA GUERRA


2008-11-08


PEDRO DOS REIS


2008-11-01


ANA CARDOSO


2008-10-27


SÍLVIA GUERRA


2008-10-18


SÍLVIA GUERRA


2008-09-30


ARTECAPITAL


2008-09-15


ARTECAPITAL


2008-08-31


ARTECAPITAL


2008-08-11


INÊS MOREIRA


2008-07-25


ANA CARDOSO


2008-07-07


SANDRA LOURENÇO


2008-06-25


IVO MESQUITA


2008-06-09


SÍLVIA GUERRA


2008-06-05


SÍLVIA GUERRA


2008-05-14


FILIPA RAMOS


2008-05-04


PEDRO DOS REIS


2008-04-09


ANA CARDOSO


2008-04-03


ANA CARDOSO


2008-03-12


NUNO LOURENÇO


2008-02-25


ANA CARDOSO


2008-02-12


MIGUEL CAISSOTTI


2008-02-04


DANIELA LABRA


2008-01-07


SÍLVIA GUERRA


2007-12-17


ANA CARDOSO


2007-12-02


NUNO LOURENÇO


2007-11-18


ANA CARDOSO


2007-11-17


SÍLVIA GUERRA


2007-11-14


LÍGIA AFONSO


2007-11-08


SÍLVIA GUERRA


2007-11-02


AIDA CASTRO


2007-10-25


SÍLVIA GUERRA


2007-10-20


SÍLVIA GUERRA


2007-10-01


TERESA CASTRO


2007-09-20


LÍGIA AFONSO


2007-08-30


JOANA BÉRTHOLO


2007-08-21


LÍGIA AFONSO


2007-08-06


CRISTINA CAMPOS


2007-07-15


JOANA LUCAS


2007-07-02


ANTÓNIO PRETO


2007-06-21


ANA CARDOSO


2007-06-12


TERESA CASTRO


2007-06-06


ALICE GEIRINHAS / ISABEL RIBEIRO


2007-05-22


ANA CARDOSO


2007-05-12


AIDA CASTRO


2007-04-24


SÍLVIA GUERRA


2007-04-13


ANA CARDOSO


2007-03-26


INÊS MOREIRA


2007-03-07


ANA CARDOSO


2007-03-01


FILIPA RAMOS


2007-02-21


SANDRA VIEIRA JURGENS


2007-01-28


TERESA CASTRO


2007-01-16


SÍLVIA GUERRA


2006-12-15


CRISTINA CAMPOS


2006-12-07


ANA CARDOSO


2006-12-04


SÍLVIA GUERRA


2006-11-28


SÍLVIA GUERRA


2006-11-13


ARTECAPITAL


2006-11-07


ANA CARDOSO


2006-10-30


SÍLVIA GUERRA


2006-10-29


SÍLVIA GUERRA


2006-10-27


SÍLVIA GUERRA


2006-10-11


ANA CARDOSO


2006-09-25


TERESA CASTRO


2006-09-03


ANTÓNIO PRETO


2006-08-17


JOSÉ BÁRTOLO


2006-07-24


ANTÓNIO PRETO


2006-07-06


MIGUEL CAISSOTTI


2006-06-14


ALICE GEIRINHAS


2006-06-07


JOSÉ ROSEIRA


2006-05-24


INÊS MOREIRA


2006-05-10


AIDA E. DE CASTRO


2006-04-05


SANDRA VIEIRA JURGENS



AMBIENTE RETINIANO – DE FRA ANGELICO A ØYVIND KOLÅ | PARTE 1



PEDRO CABRAL SANTO

2021-12-29




 

[Esta é a primeira parte do artigo Ambiente Retiniano – De Fra Angelico a Øyvind Kolå. A segunda parte pode ser lida aqui e a terceira aqui]

 


Quando estamos em presença de uma imagem visual pictórica não colocamos em causa o processo fisiológico que está a ocorrer, ou a existência dessa imagem fora da alçada dos sentidos, nomeadamente, da visão e do processamento pelo sistema visual. Uma «imagem» visualiza-se nessa relação estrita com o ato de ver (sendo o olho o seu natural interface). A perceção de uma imagem não difere nisso da perceção das diferentes facetas do mundo. No entanto, a existência da imagem, a sua «realidade», testemunha um facto que geralmente passa despercebido face à tendência para naturalizar a perceção: o entrelaçamento permanente do visual e da linguagem, do imaginário, e do simbólico – para falar como Lacan. Veja-se como, na perspetiva hoje talvez mais naturalizada do visual, a da Ecological Psychology de Gibson, é o meio ambiente que dita uma verdadeira linguagem, feita de invariantes e affordances. Só depois desse ditado, e a partir dele, pode aparecer a imagem pictórica. Para Gibson, a diferença entre a perceção do meio ambiente e a perceção de uma imagem pictórica ou de uma imagem mental é que, ao contrário destas, a perceção do meio ambiente é «perceção direta»[1]. Mas – mesmo aceitando os argumentos de Gibson a favor do primado da perceção direta – o meio ambiente só é constituído na sua relação com o organismo, e este pode ser encarado como uma estrutura semiótica que, necessariamente, investe toda a perceção [2].

É um facto que os mecanismos fisiológicos afetos à perceção visual se desenvolveram em função da sobrevivência dos organismos no seu meio ambiente. Todo o sistema visual se encontra em permanente alerta, seja para regular funções orgânicas elementares, seja para despoletar a reação a eventuais situações de perigo. Em função dessa exigência, o dispositivo visual desenvolveu uma enorme maleabilidade face a múltiplos estímulos – luz ou ausência desta, movimento lento, rápido, muito rápido, etc. Trata-se de operações aparentemente simples, mas que foram fruto, ao longo do tempo, de uma complexa evolução dos órgãos. Quando existe irradiação de luz, esta é imediatamente detetada através de uma reação automática, inconsciente, e o mesmo se passa em relação à deteção de movimento ou mesmo à necessidade de centrar um objeto no nosso campo visual, para o isolarmos e o reconhecermos através da sua forma, escala, cor ou textura. A neurociência tem-nos elucidado como, na perceção visual, as imagens se formam, em grande parte, já na própria retina, constituindo aquilo que se designa por campo ou ambiente retiniano. Este específico ambiente no qual as imagens se apresentam será apenas um passo um conjunto de operações intrincadas, que implicam toda a complexidade do sistema neuronal. Mas, na sua expressão imediata, contemplar/perceber imagens, expondo-as diretamente na retina, significa explorar fisiologicamente o campo visual, mapeando no córtex visual a sua projeção na retina. Isto ocorre sobre o pano de fundo da relação (em permanente movimento) entre o organismo e o ambiente, a qual o aparelho percetivo pode limitar-se a simplesmente duplicar e confirmar. No entanto, nesse contexto, o mínimo facto relevante vai ser imediatamente registado e induzir uma reação.

O campo retiniano forma um ambiente singular no contexto do nosso complexo sistema visual, e pode-se considerar o ponto de partida para a contemplação do mundo. Assim, tendo em conta o presente contexto, a maior ou menor acuidade com que observamos um objeto prende-se com a curiosidade e a atenção sobre o mesmo e as suas implicações para a própria sobrevivência.

Num primeiro momento, tudo aquilo que é selecionado, e simultaneamente o que é simplesmente ignorado, depende já de uma semiótica do organismo, e do modo como os seus processos simbólicos estruturam a perceção. Este fator está presente em todo o acto de ver e, em particular, em qualquer relação que se estabeleça com a imagem, mental ou pictórica, começando na própria sensibilidade do olho. Essa dimensão puramente ótica do simbólico revela-se fundamental para a arte moderna. Na medida em que esta valoriza, e procura, a rutura no simbólico – sem que de modo algum possa verdadeiramente aboli-lo – é muitas vezes através da redução aos seus componentes elementares que ela vai prosseguir, estrategicamente, esse objetivo. Assim, vamos ter múltiplos processos de redução: impressionismo, simbolismo, cubismo, surrealismo, expressionismo, minimalismo. Em qualquer caso, essa redução faz-se ou investindo diretamente a dimensão sensível e material, na sua sensibilidade e materialidade, ou investindo o próprio simbólico, de tal modo que este não pode ficar intacto – como é o caso do simbolismo ou do surrealismo – ou ainda provocando o curto-circuito das duas dimensões – como faz frequentemente o expressionismo. De qualquer modo, a imagem passa a estar em questão, de tal modo que o ótico, na sua imediatez, é diretamente convocado, mesmo que seja, como em Duchamp, para o negar – em nome do cérebro e dos seus processos simbólicos, que, como nos ensina a neurociência, estão já presentes no olho, na retina. A forma como a luz é capturada passa, assim, a constituir um primeiro fator decisivo para percebermos o mecanismo que preside à leitura de uma imagem. A luz chega ao olho em diferentes comprimentos de onda e intensidades, e é justamente na diferenciação desses comprimentos de onda e dessas intensidades, e da sua distribuição espacial, que consiste a sensibilidade do olho. Para realizar a diferenciação de um modo seletivo, possibilitando a formação de imagens a partir do que pode surgir como caos indiferenciado, o olho dispõe um conjunto de mecanismos que calibram a sua sensibilidade, preparando e mesmo antecipando o tratamento da informação pelo córtex visual [3].

Em primeiro lugar, os fotorrecetores – em especial os cones e os bastonetes [4]. No entanto, o ambiente retiniano não é povoado apenas pelos fotorrecetores. São conhecidas mais de oitenta tipos de células na retina humana, desempenhando diferentes funções especializadas no processamento da informação visual (e, em alguns casos, não visual), e organizando-se em diferentes vias neuronais conduzindo ao cérebro. As células ganglionares constituem um elemento chave deste processo, recebendo toda a informação proveniente dos fotorrecetores, e enviando-a para o cérebro. São os diversos tipos de células ganglionares que separam a informação visual, especializando-se em diferentes características, tais como luminosidade, contraste, movimento, cor ou espacialidade. E cada tipo de célula ganglionar constitui, por si só, uma rede de campos recetivos que recobre o espaço retiniano, canalizando para o cérebro um tipo específico de informação. Desse modo, cada ponto da retina parece ser representado por diversos canais especializados de informação, correspondendo, cada um, a um diferente tipo de célula ganglionar. Contudo, ainda não há acordo sobre a forma exata, e as diferentes modalidades, que assume o processamento da informação. Quantas vias neuronais existem, que informação veiculam, e como se relaciona essa informação com o conteúdo percetivo [5]?

A conceção atual do processamento visual resulta, em qualquer caso, da confluência de diversas linhas de investigação: primeiro, a ideia, avançada em 1966 por Christina Enroth-Cugell e John G. Robson, de que todo o sistema visual opera a partir de um conjunto de filtros espaciais [6]. Segundo, a ideia, avançada em 1969 por Gerald E. Schneider, de que existem duas grandes vias neuronais, uma respondendo à pergunta «onde está?» (Where is it?), a outra respondendo à pergunta «o que é?» (What is it?) [7]. Terceiro, o desenvolvimento de novas tecnologias que, nas últimas décadas, nomeadamente nos domínios dos marcadores e da retinografia, têm feito avançar o conhecimento da anatomia e do metabolismo da retina e das vias neuronais que lhe estão associadas. Por fim, Margaret Livingstone e David Hubel propuseram, em 1988, uma síntese destas três linhas de investigação que se revelou muito influente [8]. O modelo proposto identifica duas vias neuronais: a via M (magnocelular, associada às células ganglionares M, ou parasol), e a via P (parvocelular, associada às células ganglionares P, também conhecidas por anãs), com características de processamento e conteúdos associados, respetivamente, ao sistema «Where» – rapidez, baixa resolução espacial, acromatismo, sensibilidade ao alto contraste – e ao sistema «What» – maior lentidão, alta resolução espacial, sensibilidade à cor, sensibilidade ao baixo contraste. Este modelo do processamento visual é muito atraente, pela sua simplicidade – e ainda hoje é, com diversas revisões, o mais largamente aceite e difundido. No entanto, desde o início, alguns dados não encaixavam bem. Com o tempo, as discrepâncias foram-se acumulando, em particular no que se refere às perguntas fundamentais: como se constroem as sensações visuais concretas? E até que ponto se efetua a troca de informação entre os dois sistemas? Não corresponderá o processamento da informação na retina mais a um modelo de múltiplas vias neuronais paralelas (já que estão identificadas múltiplas células ganglionares M e P distintas, morfológica e funcionalmente)? O modelo necessitava, provavelmente, de uma revisão de fundo.

Um dos principais problemas levantados diz respeito à visão da cor, e consequentemente à função e funcionamento da via parvocelular (P), que no modelo de Livingstone e Hubel era responsável pelo detalhe espacial fino (o What), mas também (em parte) pela cor. A base da moderna ciência da visão cromática surgiu em 1957, quando Leo M. Hurvich e Dorothea Jameson descreveram matematicamente a visão cromática [9], nos termos da relação entre fotorrecetores e processamento neuronal prevista por Johannes von Kries [10]. No entanto, falta, mesmo hoje, determinar os processos fisiológicos que sustentam o processamento da cor [11]. A perspetiva dominante nasceu em 1966, a partir de um artigo Russell L. De Valois, Israel Abramov e Gerald H. Jacobs, que identificava quatro grupos de células espectralmente oponentes presentes no processo LGN de uma espécie primata, apresentando assim respostas espectrais compatíveis com as previsões de Hurvich e Jameson [12]. Quando Russell L. De Valois, e Karen K. De Valois apresentaram, em 1993, a revisão desta proposta [13] – tendo como objetivo principal o acerto dos eixos definidos pelos pares oponentes no espectro – já se verificava a sua convergência com o modelo avançado em 1988 por Livingstone e Hubel. O resultado é que uma parte da informação cromática processada na retina (aquela que é proveniente dos cones L e M) é comprimida – juntamente com informação acromática – na via P, através de dois tipos de células ganglionares anãs (L-M e M-L), enquanto que a outra parte (aquela que é proveniente dos cones S) é transmitida pela via K (koniocelular), através de um tipo de célula pequena bistratificada com oponência S-(M+L) [14].

 

 

Pedro Cabral Santo
Estudou Pintura e Escultura nas Faculdades de Belas-Artes de Lisboa e Porto, especializando-se nas áreas expressivas afetas à instalação e à vídeo-instalação. Em paralelo, nos últimos 20 anos, tem vindo a desenvolver as atividades de artista plástico e comissário de exposições.

 

 

:::


Notas

[1] Ver James J. Gibson, The Ecological Approach to Visual Perception (New York: Psychology Press, 2015).
[2] Ver Paul Cobley, Cultural Implications of Biosemiotics (Dordrecht: Springer, 2016).
[3] Ver David R. Williams, e Heidi Hofer, «Formation and Acquisition of the Retinal Image» (in Leo M. Chalupa, e John S. Werner (eds.), The Visual Neurosciences. Cambridge: The MIT Press, 2004, pp. 795-810).
[4] Ver Christine A. Curcio, Kenneth R. Sloan, Robert E. Kalina, e Anita E. Hendrickson, «Human Photoreceptor Topography» (The Journal of Comparative Neurology, 292 (1990): pp. 497-523).
[5] Ver Vivien A. Casagrande, e Xiangmin Xu, «Parallel Visual Pathways: A Comparative Perspective» (in Leo M. Chalupa, e John S. Werner (eds.), The Visual Neurosciences, pp. 494-506); Botond Roska, e Markus Meister, «The Retina Dissects the Visual Scene into Distinct Features» (in John S. Werner, e Leo M. Chalupa (eds.), The New Visual Neurosciences. Cambridge: The MIT Press, 2014, pp. 163-182); A. David Milner, «How Do the Two Visual Streams Interact with Each Other?» (Experimental Brain Research, 235: 5 (2017): pp. 1297-1308); e Yves Rossetti, Laure Pisella, e Robert D. McIntosh, «Rise and Fall of the Two Visual Systems Theory» (Annals of Physical and Rehabilitation Medicine, 60: 3 (2017): pp. 130-140).
[6] Ver Chistina Enroth-Cugell e John G. Robson, «The Contrast Sensitivity of Retinal Ganglion Cells of the Cat» (The Journal of Physiology, 187 (1966): pp. 517-552).
[7] Ver Gerald E. Schneider, «Two Visual Systems» (Science, 163 (1969): pp. 895-902). Ver também Mortimer Mishkin e Leslie G. Ungerleider, «Contribution of Striate Imputs to the Visuospatial Functions of Parieto-preoccipital Cortex in Monkeys» (Behaviourial Brain Research, 6: 1 (1982): pp. 57-77).
[8] Ver Margaret S. Livingstone, e David Hubel, «Segregation of form, color, movement and depth: anatomy, physiology, and perception» (Science, 240 (1988):740–749).
[9] Ver Leo M. Hurvich e Dorothea Jameson, «An opponent-process theory of color vision» (Psychological Review, 64: 6 (1957): pp. 384-404).
[10] Em 1905, Johannes von Kries propôs uma síntese das teorias de Helmholz e Hering, na qual a teoria das três cores primárias de Helmholz era válida no nível dos fotorreceptores, enquanto que a teoria das quatro cores primárias (organizadas em pares, segundo o princípio do «processo oponente») de Herring, era válida ao nível do processamento pelo sistema neuronal: ver Johannes von Kries, «Die Gesichtsempfindungen» (in W. A. Nagel (ed.), Handbuch der Physiologie der Mensche. Brunswick: Vieweg, 1905, pp. 109-282).
[11] Ver Brian P. Schmidt, Maureen Neitz, e Jay Neitz, «Neurobiological Hypothesis of Color Appearance and Hue Perception» (Journal of the Optical Society of America. A, Optics, Image Science, and Vision, 31: 4 (2014): p. 195-207), p. 195.
[12] Ver Russell L. De Valois, Israel Abramov, e Gerald H. Jacobs, «Analysis of Response Patterns of LGN Cells» (Journal of the Optical Society of America, 56: 7 (1966): pp. 966-977).
[13] Ver Russell L. De Valois, Karen K. De Valois, «A multi-stage color model» (Vision Research, 33 (1993): pp. 1053-1065).
[14] Ver Brian P. Schmidt, Maureen Neitz, e Jay Neitz, «Neurobiological Hypothesis of Color Appearance and Hue Perception», p. 195. Sobre a via K e as células pequenas bistratificadas com oponência S-(M+L), ver Stewart H. C. Hendry, e R. Clay Reid, «The Koniocellular Pathway in Primate Vision» (Annual Review of Neuroscience, 23 (2000): pp. 127-153); e Dennis M. Dacey, e Barry B. Lee, «The “Blue-on” Opponent Pathway in Primate Retina Originates From a Distinct Bistratified Ganglion Cell Type» (Nature, 367 (1994): pp. 731-735).


:::


Bibliografia

KOLAS; Øyvind Kolas, FARUP, Ivar ; RIZZI, Alessandro, “Spatio-Temporal Retinex-Inspired Envelope with Stochastic Sampling: A Framework for Spatial Color Algorithms” (Journal of Imaging Science and Technology, 55: 4 (2011).

Margaret S. Livingstone, Vision and Art: The Biology of Seeing, New York: Harris N. Abrams, Inc., 2002.

Ulrich Middeldorf , “L’Angelico e la Scultura”. Rinascimento, 6: 2 (1955).

James J. Gibson, The Ecological Approach to Visual Perception (New York: Psychology Press, 2015).

Paul Cobley, Cultural Implications of Biosemiotics (Dordrecht: Springer, 2016).

David R. Williams, e Heidi Hofer, «Formation and Acquisition of the Retinal Image» (in Leo M. Chalupa, e John S. Werner (eds.), The Visual Neurosciences. Cambridge: The MIT Press (2004).

Christine A. Curcio, Kenneth R. Sloan, Robert E. Kalina, e Anita E. Hendrickson, «Human Photoreceptor Topography» (The Journal of Comparative Neurology, 292 (1990).

Botond Roska ; Markus Meister, “The Retina Dissects the Visual Scene into Distinct Features” (The New Visual Neurosciences (John S. Werner, e Leo M. Chalupa, eds.), Cambridge: The MIT Press (2014).

Botond Roska, e Markus Meister, «The Retina Dissects the Visual Scene into Distinct Features» (in John S. Werner, e Leo M. Chalupa (eds.), The New Visual Neurosciences. Cambridge: The MIT Press (2014).

David Milner, «How Do the Two Visual Streams Interact with Each Other?» (Experimental Brain Research, 235: 5 (2017).

Yves Rossetti, Laure Pisella, e Robert D. McIntosh, «Rise and Fall of the Two Visual Systems Theory» (Annals of Physical and Rehabilitation Medicine, 60: 3 (2017).

Chistina Enroth-Cugell e John G. Robson, «The Contrast Sensitivity of Retinal Ganglion Cells of the Cat» (The Journal of Physiology, 187 (1966).

Mortimer Mishkin e Leslie G. Ungerleider, «Contribution of Striate Imputs to the Visuospatial Functions of Parieto-preoccipital Cortex in Monkeys» (Behaviourial Brain Research, 6: 1 (1982).

Margaret S. Livingstone ; David Hubel, «Segregation of form, color, movement and depth: anatomy, physiology, and perception» (Science, 240 (1988).

Russell L. De Valois, Israel Abramov, e Gerald H. Jacobs, «Analysis of Response Patterns of LGN Cells» (Journal of the Optical Society of America, 56: 7 (1966).

Stewart H. C. Hendry, e R. Clay Reid, «The Koniocellular Pathway in Primate Vision» (Annual Review of Neuroscience, 23 (2000).

Ian Verstegen, «John White’s and John Shearman’s Viennese Art Historical Method» (Journal of Art Historiography, 1 (2009).

Ulrich Middeldorf, «L’Angelico e la Scultura» (Rinascimento, 6: 2 (1955).

Carl Brandon Strehlke, Angelico (Milano: Editoriale Jaca, 1998).

Georges Didi-Huberman, «La Dissemblance des Figures selon Fra Angelico» (Mélanges de l'Ecole Française de Rome: Moyen-Age, Temps Modernes, 98: 2 (1986).

SHEARMAN, John, “Leonardo's Colour and Chiaroscuro” (Zeitschrift für Kunstgeschichte, 25 (1962).

Michael Baxandall, Painting and Experience in Fifteenth Century Italy: A Primer in the Social History of Pictorial Style (Oxford: Oxford University Press (1972).