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OSCAR MURILLOTOGETHER IN OUR SPIRITSMUSEU DE SERRALVES - MUSEU DE ARTE CONTEMPORÂNEA Rua D. João de Castro, 210 4150-417 Porto 30 NOV - 26 MAI 2024 Em coletivo, com Oscar Murillo
Com o título Together in Our Spirits, Murillo inaugurou, no dia 29 de novembro, no Museu de Arte Contemporânea de Serralves, a sua primeira exposição individual em Portugal, com curadoria de Inês Grosso e coordenação de Filipa Loureiro. Trata-se de uma relevante ocasião, sobretudo considerando o percurso do artista, definido por um crescimento assertivo que lhe tem vindo a conferir notoriedade e um elevado reconhecimento a escala internacional. Destaco o seu projeto Frequencies, iniciado há dez anos, que propõe a criação artística como ferramenta de comunicação a jovens estudantes entre os dez e os dezasseis anos. Como o artista explica, trata-se de um projeto tão intelectual e psicológico quanto físico e material. Integrando inúmeras escolas de diversos países, Frequencies materializa-se enquanto retrato das comunidades de diferentes contextos e, recorrendo às palavras do artista, “um mapeamento” das suas experiências, similitudes e diferenças. Murillo refere-se ao seu projeto como uma “biblioteca” onde se reúnem “arquivos” com os quais “percorre o mundo”. Esta ideia de transversalidade é também convocada pela predominante utilização da cor azul, representativa da água, elemento comum a todos os povos, e, como a curadora refere, dotado de uma particular permeabilidade. Com efeito, a água, sobretudo a do mar, penetra e trespassa além-fronteiras. É, justamente, em Frequencies que se inscreve a atual exposição. O convite feito ao artista foi motivado, em parte, pelo intuito de trazer a Serralves e a Portugal [1] o que se considera constituir um contributo significativo para o desenvolvimento educativo das artes, e para nutrir o valor do coletivo e da empatia, pelo outro e pelo mundo. Nesta mostra, a par de algumas das mais relevantes obras de Murillo dos últimos anos, encontram-se outras, novas, concebidas para o Museu de Serralves, mais especificamente, para o Hall e a Galeria Contemporânea. Sublinhe-se estes últimos consistirem em dois espaços de livre acesso, o que agradou ao artista na medida em que considera que a sua arte deve ser aberta e acessível a todos. No Hall, distribuem-se bustos de vestuário onde se unem escultura e pintura e um grupo de mesas em torno das quais se expõem óleos da série Disrupted Frequencies. Todas as peças foram concebidas a partir do trabalho desenvolvido pelas escolas, do qual Murillo se apropria para nele intervir com pinceladas largas e expressivas, em formas livres e em movimentos que evocam o que apela de “força obliteradora da água”. Paralelamente, esta ação sobre os objetos subverte o processo do arquivo, pois ao invés de os preservar, propõe a sua transformação e a sua reapresentação enquanto algo de novo. Sobre a Galeria Contemporânea, “em torno da qual tudo se desdobra”, citando Inês Grosso, apresentam-se três corpos de trabalho nos quais se reúnem a pintura, a escultura e o vídeo. Nas paredes, três cortinas pintadas, da série Surge, com o subtítulo Social Catarats, e, no centro, pequenas pinturas em tela integram uma instalação intitulada Mesmerizing Beauty. Murillo remete para os nenúfares de Monet e, a partir daí, para o declínio da visão do artista francês. O seu intuito é denunciar uma cegueira social coletiva ou, recorrendo às palavras de Inês Grosso, “uma sociedade incapaz de ver”. A última peça exibida neste espaço da exposição é um filme gravado de modo quase rudimentar ou, como o artista descreve, “hesitante”. Realizado no centro Rockefeller, em Manhattan, um lugar histórico e sucessivamente eleito para manifestações e protestos, incita à reflexão sobre os conceitos de liberdade, disparidade e justiça social, não somente no quadro dos Estados Unidos da América, mas de toda a cultura ocidental. Ainda, e a nível transversal, a obra do artista questiona o que representam as noções de coletivo e comunidade, instigando a discussão sobre diversas problemáticas sociais e tensões geopolíticas. Contudo, o que Murillo sublinha enquanto “conceito geral” ou “estrutura da exposição” é uma contínua preocupação com o desenho, quer na pintura, quer na instalação e nos objetos escultóricos. O desenho tende a surgir como mecanismo de recolha de informação e de comunicação, tal como se observa na arrebatadora pintura que se expõe na Capela de Serralves. Nesta, que consiste numa das maiores obras da recente série do artista Manifestation, a tela é utilizada e manuseada como instrumento linguístico e meio de comunicação, como objeto de coletividade e partilha, para “todas as possibilidades que estejam por vir”. Para finalizar, recorro, uma vez mais, às palavras de Oscar Murillo: a exposição Together in Our Spirits é "um gesto poético em prol do coletivo”. Com efeito, é através de um modo profundamente sensorial, de notável e sui generis qualidade estética, que a exposição apela à consciencialização do campo social, provando, de forma notável, a inextrincável relação entre a arte e a vida.
[1] Em Portugal, o projeto contou com a colaboração das seguintes escolas: Escola Secundária da Boa Nova (Matosinhos), Escola Secundária Fontes Pereira de Melo (Porto), Escola Secundária João Gonçalves Zarco (Matosinhos), Agrupamento de Escolas de Alfena (Valongo), Escola Básica e Secundária Gomes Teixeira (Armamar), Agrupamento de Escolas Dr. Serafim Leite (São João da Madeira), Colégio D. José (Aveiro), Escola Secundária José Régio (Vila do Conde), Escola Secundária de Barcelinhos (Barcelos), Escola Básica Maria Manuela de Sá (Matosinhos), Escola Secundária Miguel Torga (Bragança).
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